A seção Ciência discutiu várias atividades humanas que estão acelerando a mudança climática global. Entre elas:
- A queima de combustíveis fósseis e emissão de excesso de gás CO2 na Atmosfera.
- A fabricação de fertilizante inorgânico, operação maciça de máquinas de campo, agricultura industrial, transporte global de alimentos – práticas agrícolas industriais que aumentam as emissões de gases de efeito estufa.
- O desmatamento de trechos maciços de floresta e selva, removendo assim a vegetação necessária para absorver CO2.
O especialista em ética Stephen Gardiner chama a mudança climática global de “tempestade moral perfeita” porque ela combina vários problemas éticos altamente complexos.1 Primeiro, a mudança climática é um problema global em um mundo sem uma autoridade política internacional plenamente capaz de administrá-lo. A ONU é uma instituição muito valiosa, mas não possui – em si – poder suficiente para aplicar efetivamente sua política planetária sobre as emissões de CO2 (veja o Protocolo de Kyoto). O sistema político global continua sendo um grupo de 195 estados-nação independentes, cada um ocupado racionalmente em assegurar seus próprios interesses e assim muitas vezes engajando-se em ações contrárias aos melhores interesses do mundo como um todo.
Análise Detalhada
A Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima de 2018 em Katowice, Polônia foi a 24ª Conferência das Partes (COP24) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. A conferência concordou com as regras para implementar o Acordo de Paris de 2015. Um dos momentos mais emocionantes foi a palestra da jovem sueca Greta Thunberg, de 15 anos. Assista a este vídeo para ouvir a perspectiva dos jovens sobre a mudança climática global.
Em segundo lugar, a mudança climática é um problema intergeracional. Como os gases de efeito estufa que continuamos a liberar na Atmosfera permanecerão nela por muito tempo, as gerações futuras sofrerão os maiores efeitos da mudança climática global.
Como os políticos precisam mostrar realizações no curto período de tempo em que estão no cargo, a maioria não está disposta a propor ações climáticas que custam caro hoje e que só mostrarão seus efeitos no futuro.
Finalmente, existe um diferencial de poder entre as pessoas que mais sofrem com a mudança climática e as pessoas responsáveis por causá-la. Na economia global, os últimos são financeiramente poderosos – e desfrutam de estilos de vida ligados aos bens de consumo responsáveis pelas emissões de CO2; os primeiros são financeiramente sem poder – e têm estilos de vida que utilizam comparativamente pouco dos bens responsáveis pelas emissões de CO2.
Olhando para trás
Para rever os fundamentos e normas da ética ambiental do Healing Earth, retorne à Introdução ao Healing Earth.
Esta “tempestade moral perfeita” nos lembra das questões básicas colocadas no final do estudo de caso dos pastores mongóis que abriram este capítulo.
- A mudança climática global criou novos problemas morais não apenas para os pastores mongóis, mas também para todos os seres humanos na Terra. Quais são esses problemas morais?
- Quem é responsável por esses problemas?
- Que princípios, metas e virtudes morais devem orientar nossa resposta a esses problemas?
Os problemas morais levantados pela mudança climática global nos levam de volta aos três fundamentos da ética ambiental de Healing Earth:
- O mundo natural tem valor intrínseco.
- O mundo natural tem valor instrumental.
- O valor da sustentabilidade equilibra os valores intrínseco e instrumental da natureza.
Esses três fundamentos éticos dão origem aos princípios, objetivos e virtudes morais que devem guiar nossa resposta às mudanças climáticas.
Princípios morais
As características bióticas e abióticas do mundo natural têm um valor intrínseco digno do respeito humano. Isso significa que o clima que envolve e sustenta nosso planeta tem valor. Para respeitar esse valor, os humanos devem se preocupar com o clima da Terra. Os bispos católicos romanos dos Estados Unidos concordam. Em sua declaração sobre a mudança climática global, os bispos afirmam que “a Atmosfera que sustenta a vida na Terra é um dom dado por Deus, que devemos respeitar e proteger.”3
Isso não significa que toda ação humana que cria gases de efeito estufa seja moralmente errada. Usar combustíveis fósseis, cultivar a terra e derrubar árvores não são, em si, ações imorais. A imoralidade ocorre quando a escala do uso de nossos combustíveis fósseis, a agricultura industrial e o desmatamento ultrapassam a capacidade da atmosfera da Terra de se restaurar. Como repetimos em todo o Healing Earth, os recursos naturais do nosso planeta têm valor instrumental para a vida humana e não humana. No entanto, o valor moral fundamental da sustentabilidade deve guiar e moderar nosso uso instrumental desses recursos.
As ações de uma pessoa normalmente não podem fazer uma grande alteração nos níveis de CO2 planetários; mas todo esforço se soma. Sabendo que o efeito cumulativo da ação humana está aquecendo a atmosfera da Terra, cada um de nós tem a responsabilidade moral de reduzir nossa pegada de carbono, fazendo esforços reais para reduzir o uso de combustíveis fósseis, reduzindo nosso consumo de produtos desnecessários, comprando mais alimentos de agricultores orgânicos regionais e fazendo reciclagem. Como declarado no Compêndio Católico Romano da Doutrina Social da Igreja, “o clima é um bem que deve ser protegido” e, para isso, os consumidores devem “desenvolver um maior senso de responsabilidade por seu comportamento”.4
A mudança climática global também afeta nossos esforços para respeitar os direitos humanos. Hoje, os países ao redor do mundo são incapazes de honrar o direito à segurança, alimentos, água e saúde de seus cidadãos, porque os governos locais, regionais e nacionais não conseguem administrar os impactos sociais das secas induzidos pela mudança climática e o aumento do nível do mar. Desde 2008, uma média de 24 milhões de pessoas têm sido deslocadas por desastres climáticos catastróficos a cada ano.
A Environmental Justice Foundation (Fundação para a Justiça Ambiental) estima que países como Tuvalu, Fiji, Ilhas Salomão, Ilhas Marshall e Maldivas provavelmente perderão todas ou uma parte significativa de suas terras nos próximos 50 anos devido à elevação do nível do mar.5 Hoje em dia, estima-se que o número de refugiados do clima no mundo seja três vezes maior do que o número de pessoas expulsas de suas casas por guerras.6
Questões a considerar
A legislação internacional referente a refugiados deveria incluir o desalojamento causado pela mudança climática? Atualmente, a legislação internacional não ajuda as pessoas que buscam segurança no exterior por seus lares e meios de subsistência terem sido destruídos por fenômenos relacionados à mudança climática. Ela deveria ajudar? Em caso afirmativo, os países que emitem mais CO2 deveriam ser responsabilizados pela realocação dos refugiados do clima? Leia uma discussão a respeito.
Em 2014, a Nova Zelândia tornou-se o primeiro país do mundo a aceitar pedidos de refúgio de famílias que citavam a mudança climática global como a razão pela qual não podem voltar para suas casas.10 Nas Nações Unidas, a Convenção Internacional para os Refugiados ainda não reconhece a mudança climática e o aumento do nível do mar como condições legítimas para solicitar o status de refugiado.
A Atmosfera abrange todos os habitats e habitantes da Terra. É um bem comum ambiental, uma característica da natureza necessária para que os seres humanos tenham “acesso à sua própria realização”.11 Mais uma vez, como os bispos dos EUA escrevem em sua declaração sobre a mudança climática global:
As respostas às mudanças climáticas globais devem refletir nossa interdependência e responsabilidade comum pelo futuro de nosso planeta. As nações individuais devem equilibrar seus próprios interesses a favor do bem comum maior e contribuir equitativamente para soluções globais.12
Análise Detalhada
Os efeitos da mudança climática, como a seca, causam a fome em muitas partes do mundo. Como resultado, a violência muitas vezes ocorre em função da distribuição de recursos escassos. Veja este vídeo mostrando o que aconteceu com os aldeões no nordeste do Quênia como resultado da seca ocasionada pela mudança climática.
O princípio ético do bem comum pede a todos nós que reduzamos os gases de efeito estufa e nos empenhemos para atender às necessidades de sobrevivência dos refugiados do clima.
Nenhum país possui a Atmosfera; ela faz parte dos bens comuns planetários. Isso significa que o princípio ético do destino universal dos bens inclui o clima. Este princípio afirma que a disponibilidade ou “destinação” de bens necessários à vida é “universal”; ou seja, um bem básico como um clima habitável é “propriedade” de todos, não deve ser comprometido para algumas pessoas pelas ações dos outros. Para demonstrar este princípio positivamente, todos nós temos a obrigação moral de cuidar da Atmosfera em benefício da coletividade.
Como observado acima, as pessoas que mais sofrem com os efeitos da mudança climática global são os pobres, a maioria dos quais não fez nada para causá-la. E por que isso acontece? O Potsdam Institute for Climate Impact Research (Instituto Potsdam para Pesquisa sobre o Impacto Climático) cita seis razões.
Closer Look
Para um excelente resumo dos princípios morais aplicáveis às mudanças climáticas globais, veja esta apresentação do Arcebispo Sul-Africano Desmond Tutu.
- os pobres correm maior risco porque sua nutrição e estado de saúde são muito piores do que os das pessoas mais ricas.os pobres estão expostos a um risco maior, porque a sua nutrição e estado de saúde são muito piores do que os das pessoas mais ricas.
- os pobres são mais propensos a viver onde o clima já é extremo (muito quente ou árido, com variações sazonais drásticas ou eventos climáticos intensos).
- o sustento dos pobres é geralmente baseado em recursos naturais sensíveis ao clima (agricultura, silvicultura, pesca).
- os pobres normalmente têm dificuldade em acessar informações (alertas de mau tempo).
- os pobres têm menos bens monetários e nenhuma cobertura de seguro contra as dificuldades de adaptação às mudanças climáticas.
- os pobres são frequentemente excluídos dos processos políticos de seu governo, tornando mais difícil o acesso ao apoio do estado antes, durante ou depois de um desastre natural induzido pela mudança climática.13
Por outro lado, aqueles que menos sofrem com a mudança climática global são pessoas de nações ricas e industrializadas, que são responsáveis por causá-la. De uma perspectiva ética, isso impõe uma responsabilidade especial às pessoas mais favorecidas de proteger os pobres, mitigando comportamentos que contribuam para a mudança climática global. Esta ação é exigida pelo princípio moral da opção preferencial pelos pobres.
Questões a considerar
Imagine que peçam à sua pequena vila de 1.000 pessoas para aceitar na comunidade 50 refugiados do clima que tiveram que deixar sua ilha natal devido ao aumento do nível do mar.
- Faça uma lista dos desafios práticos que esse pedido pode representar para sua vila.
- Faça uma lista dos princípios, objetivos e virtudes morais relevantes para manter sua vila como uma comunidade segura e próspera.
- Faça uma lista das prováveis necessidades dos 50 refugiados do clima.
- Faça uma lista dos princípios, objetivos e virtudes morais relevantes para sua decisão de aceitar ou rejeitar os refugiados do clima em sua vila.
- Tome uma decisão e explique as razões práticas e morais por trás dela.
Objetivos Morais
O principal objetivo moral em relação à mudança climática global é a redução das emissões de CO2 na Atmosfera. Para alcançar este objetivo, as pessoas e nações devem trabalhar para:
- eliminar o uso de combustíveis fósseis
- refrear as emissões de gases de efeito estufa
- reduzir o consumo de produtos desnecessários com emissões de CO2 incorporadas
- diminuir as atividades de desmatamento
- reduzir as práticas agrícolas industriais
- reduzir a ineficiência energética das construções antigas
- aumentar o uso de energia eólica, solar ou outras fontes renováveis de energia
- intensificar as atividades de reflorestamento
- ampliar as práticas agrícolas sustentáveis
- melhorar a eficiência energética das novas construções
Desde 1995, as Nações Unidas realizam conferências anuais sobre mudanças climáticas. O órgão regulador da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) é a Conferência das Partes (COP). Este grupo avalia o progresso global no tratamento da mudança climática e negocia obrigações legalmente vinculantes para os países desenvolvidos reduzirem suas emissões de gases de efeito estufa.
Na COP 21 em Paris, em 12 de dezembro de 2015, a Conferência das Partes chegou a um marco ‘Acordo de Paris’. Pela primeira vez, todas as nações foram trazidas para uma causa comum de combate às mudanças climáticas. O objetivo central do Acordo de Paris é manter o aumento da temperatura média global bem abaixo de 2 ° C acima dos níveis pré-industriais e limitar o aumento a 1,5 ° C.
Nos termos do Acordo de Paris, cada país planeja e relata regularmente a contribuição que assume para mitigar o aquecimento global. Em junho de 2017, o presidente dos EUA, Donald Trump, anunciou sua intenção de retirar seu país do acordo. Segundo o acordo, a data mais próxima de retirada efetiva para os EUA é novembro de 2020. Na prática, as mudanças na política dos Estados Unidos que são contrárias ao Acordo de Paris já foram implementadas. Entretanto, em janeiro de 2021, o recém-eleito Presidente Biden voltou oficialmente a aderir ao Acordo de Paris.
Questões a considerar
Inicialmente você aprendeu sobre a “tragédia dos comuns” na seção Ética do Capítulo Recursos Naturais. Alguns especialistas em ética veem a mudança climática global como uma “tragédia dos comuns”. Eles querem dizer que, embora uma atmosfera saudável faça parte dos “bens comuns” desejados por todos, a maioria das pessoas não se sente suficientemente motivada para mudar seu estilo de vida pessoal e reduzir as emissões de CO2. Assim, a tragédia da mudança climática continua. Quais são as interconexões neste ecossistema natural que tornam a vida possível?
Você consegue imaginar uma maneira de incentivar as pessoas a mudar seu estilo de vida e reduzir o consumo de combustíveis fósseis e bens desnecessários? Consegue pensar em quaisquer metas morais administráveis que ajudem a motivar as pessoas a reduzir as suas emissões de CO2?
Virtudes Morais
Análise Detalhada
O Dr. David Suzuki tem sido um ativista corajoso de longa data, empenhado em reverter as mudanças climáticas. Assista a este breve vídeo para conhecer o Dr. Suzuki e este vídeo mais longo para ouvir em detalhes seus pontos de vista sobre a mudança climática global.
A virtude moral mais imperiosa para enfrentar o desafio da mudança climática global é a justiça. Todos nós precisamos de um sentido maior de justiça para sermos motivados a agir na Atmosfera de forma a aliviar o sofrimento das gerações pobres e futuras.
Isso inclui a coragem de parar de terceirizar os custos ambientais do uso de combustíveis fósseis. Como Markus Vogt diz em Climate Justice, “estamos usando a Atmosfera como lixo e literalmente queimando o futuro de nossos filhos e netos”.14 Devemos continuar explorando maneiras de incluir os efeitos ambientais da emissão de CO2 na fabricação e preço de compra de produtos que usam combustível fóssil.
Segundo os Bispos dos EUA, “nossa resposta ao desafio da mudança climática deve estar enraizada na prudência”.15 Isso significa que é essencial que entendamos o que está entrando na Atmosfera quando consumimos recursos naturais e produzimos resíduos, para identificar os princípios éticos em jogo e adotar medidas apropriadas. Dadas as sólidas evidências científicas sobre o perigo de emissões excessivas de CO2, a prudência determina que eliminemos o uso de combustíveis fósseis e passemos a adotar fontes de energia renováveis.
A temperança é outra virtude importante para responder às mudanças climáticas globais. A temperança é a virtude da moderação, expressa através da restrição pessoal. Enquanto as fontes de energia renováveis estão em desenvolvimento, as pessoas devem estar dispostas a restringir o uso de eletricidade, desligando aparelhos elétricos quando não estiverem em uso e diminuindo os termostatos (a combustão de combustíveis fósseis para gerar eletricidade é a maior fonte de emissões de CO2). As pessoas também precisam reduzir o uso de transporte (a segunda maior fonte de emissões de CO2 são veículos rodoviários, viagens aéreas, transporte marítimo e ferroviário).
Análise Detalhada
Essas ações também refletem as virtudes de bondade e generosidade para com os outros e gratidão pelo presente que é a atmosfera da Terra. Como os Bispos Católicos Romanos das Filipinas afirmam em sua Exortação Pastoral sobre as Mudanças Climáticas,
A tarefa de abordar o aquecimento global e as mudanças climáticas é, portanto, urgente. Começa com uma profunda gratidão pelos dons que Deus nos deu e um compromisso renovado com a sagrada confiança de cuidar desses dons.17
Ao chamar o cuidado com a Atmosfera de “confiança sagrada”, os bispos nos convidam a considerar a dimensão espiritual de nosso relacionamento com o mundo natural. É essa dimensão que nos dá a convicção e energia de que precisamos para viver os princípios, objetivos e virtudes éticos necessários para a cura do clima da Terra. Para identificar nosso próprio relacionamento espiritual com o clima da Terra, é útil explorar essa relação em pessoas com espiritualidades enraizadas nas religiões do mundo.
Questões a considerar
Que tipo de virtudes morais você acha que uma pessoa precisa ter para ser tanto um cientista ambiental quanto um ativista ambiental? Você conhece uma pessoa com essas qualidades? Em caso positivo, considere entrevistar essa pessoa para descobrir como iniciou sua carreira e como decidiu cuidar do meio ambiente. Você consegue se ver cuidando do meio ambiente enquanto evolui em sua carreira?